Cérebro faz computação quântica
Cientistas irlandeses acreditam ter feito a demonstração cabal de que o cérebro humano usa fenômenos quânticos para funcionar.
Há muito se desconfia de que, além das computações do tipo clássica, em que os neurônios interagem por meio de sinapses, usando correntes bioelétricas e iônicas, o cérebro também usa fenômenos quânticos em nível de partículas e quasipartículas.
Já existe até um Projeto Cérebro Quântico tentando provar que somos computadores quânticos biológicos, bem como tentativas de reproduzir isso usando átomos para fazer uma computação sem software.
Contudo, como mal começamos a construir as unidades básicas dos computadores quânticos, os qubits, é muito difícil demonstrar que efetivamente está ocorrendo algum tipo de computação quântica em um cérebro vivo.
Por isso, Christian Kerskens e David Pérez, do Trinity College de Dublin, foram buscar ajuda de propostas recentíssimas de testar a gravidade quântica, o caminho mais promissor para unificar a Teoria da Relatividade com a Mecânica Quântica.
"Nós adaptamos uma ideia, desenvolvida para experimentos para provar a existência da gravidade quântica, em que você pega sistemas quânticos conhecidos, que interagem com um sistema desconhecido. Se os sistemas conhecidos se entrelaçarem, então o desconhecido também deve ser um sistema quântico. Isso contorna as dificuldades para encontrar dispositivos de medição para algo sobre o qual nada sabemos," disse Kerskens.
Gravidade Quântica
O projeto mais recente de um experimento para testar a gravidade quântica envolve o uso de sensores naturais embutidos no diamante, conhecidos como vacâncias de nitrogênio, que também são usados como qubits para computadores quânticos.
A vacância surge quando um átomo de carbono do diamante é substituído por um átomo de nitrogênio, o que exige um elétron extra. É esse elétron que funciona como um sensor quântico ao ficar em uma superposição de spin para cima e spin para baixo - o mesmo processo do conhecido gato de Schrodinger.
E isso pode ser usado para detectar ondas, de um único fóton a ondas de gravidade, eventualmente demonstrando a existência dos grávitons, as hipotéticas "partículas" de gravidade.
A ideia dos dois físicos consistiu em usar um mecanismo similar para detectar fenômenos quânticos ocorrendo dentro do cérebro.
Cérebro quântico
Em vez de usar o elétron extra no diamante como sensor, a dupla se voltou para ferramentas já usadas para o estudo do cérebro.
"Para nossos experimentos, usamos spins de prótons de 'água cerebral' como o sistema conhecido. A 'água cerebral' acumula-se naturalmente como fluido em nossos cérebros e os spins dos prótons [núcleos de hidrogênio] podem ser medidos usando imagem por ressonância magnética. Então, usando um projeto específico de ressonância magnética, para procurar spins entrelaçados, nós descobrimos sinais de ressonância magnética que se assemelham aos potenciais evocados dos batimentos cardíacos, uma forma de sinais de EEG [eletroencefalografia]," detalha o pesquisador.
Potenciais eletrofisiológicos, como os potenciais evocados dos batimentos cardíacos, normalmente não são detectáveis com ressonância magnética, o que faz os dois físicos acreditarem que só puderam observá-los porque os spins de prótons nucleares no cérebro estavam entrelaçados.
"Se o entrelaçamento é a única explicação possível aqui, isso significaria que os processos cerebrais devem ter interagido com os spins nucleares, mediando o entrelaçamento entre os spins nucleares. Como resultado, podemos deduzir que essas funções cerebrais devem ser quânticas.
"Como essas funções cerebrais também foram correlacionadas ao desempenho da memória de curto prazo e à consciência, é provável que esses processos quânticos sejam uma parte importante das nossas funções cerebrais cognitivas e conscientes," defendeu Kerskens.
Biologia e consciência
A dupla reconhece que será necessário um grande esforço multidisciplinar para confirmar suas descobertas, eliminando todas as possibilidades de erros no experimento ou em sua interpretação.
Mas certamente valerá o esforço.
"Processos cerebrais quânticos podem explicar por que ainda podemos superar os supercomputadores quando se trata de circunstâncias imprevistas, tomadas de decisões ou aprendizado de algo novo. Nossos experimentos, realizados a apenas 50 metros do auditório onde Schrodinger apresentou seus famosos pensamentos sobre a vida, podem lançar luzes sobre os mistérios da biologia e sobre a consciência, que cientificamente é ainda mais difícil de entender," concluiu Kerskens.
Bibliografia: Artigo: Experimental indications of non-classical brain functions Autores: Christian Matthias Kerskens, David López Pérez Revista: Journal of Physics Communications Vol.: 6, Number 10 DOI: 10.1088/2399-6528/ac94be
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